Conheçamos e prossigamos em conhecer ao Senhor; a sua saída, com a alva, é certa;
e Ele nós virá como a chuva, como a chuva serôdia que rega a terra.
Oséias 6 : 3

17 de outubro de 2014

DEUS É MÚSICA!

"...Tu és Santo, entronizado sobre os louvores de Israel."
                                                                                               Salmos 22:3


A música é, incontestavelmente, uma das linguagens universais; portanto, uma das incríveis manifestações de Deus. Sua existência se confunde com a deidade, que, de forma enigmática, eclodiu estrondosa e necessária em tempos mais do que pretéritos, como a origem de tudo que existe acima e abaixo das moradas celestiais. Daí, a noção basilar de que sem a música, a Criação, provavelmente, padeceria de uma melancolia eterna, o que não agradaria e nem tampouco estaria nos planos do Criador, ao executar a sua obra máxima, relatada no livro de Gênesis: a Terra e seu habitante ilustre, o Homem. 

Cantem ao Senhor um novo cântico,
seu louvor desde os confins da terra,
vocês, que navegam no mar, 
e tudo que nele existe, 
vocês, ilhas, e todo os seus habitantes. 
Isaías 42:10


É fascinante imaginar o cenário primevo, que instaurou todas as realidades, que se desdobraram a partir do evento inenarrável, que fora o ato divino da Criação, desde a suprema permanência de Deus, na linha da Eternidade; e, desse modo, representando o que sempre foi, o que é e o que sempre será, de forma inexorável. A visão do surgimento do universo, dos mundos, da terra; de toda a natureza, dos seres e do Homem, sob os acordes divinos, não deve ser compreendida como metáfora ou alucinação de quem investiga as Escrituras Sagradas em seus incontáveis enigmas; mas, antes, como um grande ensaio da Teopoética, que desvela, nos aparentes planos da mensagem teológica, os fatos e acontecimentos, que compuseram a história sobre Deus e de sua presença irrefutável na trajetória da Humanidade.

Aleluia! Louvai ao Senhor do alto dos céus, louvai-o nas alturas.
Louvai-o, todos os seus anjos: louvai-o, todas as legiões celestes.
Salmos 148:1-2


A música é inerente ao ser humano, e o mundo não existiria sem esta forma inexplicável e singular, que emergiu das densas cadeias da espiritualidade. Portanto, a conclusão é lógica: antes da existência de todas as coisas, a música, em sua cadência etérea, ressoava nas dimensões infinitas da suprema inteligência, que engendrou na Vida o movimento e o sentido de tudo que está nas escalas não - numeráveis dos multiversos. A despeito disso, indaga-se: qual teria sido o som da Criação? O silêncio que antecedeu os primórdios cedeu espaço para a grande pauta musical, onde Deus, arregimentando notas e acordes, e de uma forma harmônica e perfeita, orquestrou cada tom, cada semitom, nos diversos andamentos, allegro, adagio e andante, para além dos fôlegos cognoscíveis, para além dos mundos (im)pensáveis pela compreensão humana. O Altíssimo postulou pausas e prelúdios. Se a Humanidade herdou das altas e insondáveis vagas do Senhor dos Senhores uma das mais preciosas heranças, que é a música, é porque Deus, além dos anjos, incumbiu ao Homem para o verdadeiro exercício da Adoração e do Louvor. Os seres espirituais e o seres carnais, em planos distintos, formam o grande coro de reconhecimento e exaltação da magnificência, que é o poderoso Iavé - o Impronunciável - em sua musicalidade fausta e tremenda.
Pois o Senhor é grande
e muitíssimo digno de louvor,
ele deve ser mais temido
que todos os deuses.
1 Crônicas 16:25


A música está em todos os lugares. A música precede a existência de todos os seres viventes. Do pulsar de uma estrela à batida de um coração, os sons naturais rufam esplendorosamente em tambores perfeitos; das tempestades solares às chuvas que regam os campos na terra, melodias, singulares e plurais, são ouvidas, cada qual em seu ritmo, cadeia, escala e natureza! Os ventos assoviam nos pulmões invisíveis da Criação, e a canção do Espírito Santo, que é fogo invisível, ao crepitar suas labaredas poderosas e temíveis, ecoa, em modo terrífico, abrasando sons de destruição ou de purificação: é o rito permanente e imutável do Sagrado! Há música por todos os lados: presentes nos quatro elementos naturais, que sustentam a obra da Criação, onde a forma e a substância, harmônicas como a música, conferiram o sentido misterioso de tudo que existe no mundo natural e para além dele. O Fiat Lux, indubitavelmente, fora o primeiro verso de uma canção, que ainda não teve o seu final escrito e/ou executado, e a voz do Altíssimo, em tremores retumbantes, que varreram a Eternidade, fez sangrar o ventre do Universo para que os mundos, segundo sua excelsa vontade, fossem criados. Em sua hedionda presença, servindo-O, com glória e majestade, miríades e miríades de anjos, louvam, com brados refulgentes e gloriosos, anunciando, para todo o sempre, o primado da Luz e sua canção de amor e perfeição. Após a orquestra de luz introduzir o movimento inicial da melodia da Criação, o ser que nasceu do barro e que recebera nas narinas o fôlego da vida - RUACH* - tornou-se o Adorador primo nas esferas infinitas da espiritualidade. Seu cântico de agradecimento transformou a música imponderável do Senhor dos Exércitos em louvores (mais do que) altissonantes. 

Bendigam o nosso Deus, ó povos,
façam ressoar o som do seu louvor...
Salmos 66:8


A música que precedeu o Nada e o Tudo traz a assinatura do Eterno, que se confunde com os sons, e que, em tempos imemoriais, compuseram a essência dos primeiros seres a habitarem os céus: os Anjos. Em sua constituição ígnea, o fogo ardente do Espírito Santo aquecia, em vapores imensuráveis e incompreensíveis, para a inteligência humana, os sopros, que, em sua forma natural, foram as tempestades, as explosões, os terremotos, os maremotos; e toda a cadeia de fenômenos físicos e metafísicos, que deram a origem e o acabamento final da face bela, brilhante e incorruptível, no Caos, do planeta Terra: morada de todos os seres viventes; réplica celestial do paraíso, em patamares inferiores, até o advento do pecado. Arcanjos, serafins e querubins integravam o grande coro divino, que, eternamente, entoava cânticos de louvores ao Deus de toda Criação. Na terra, quando os filhos do Senhor aprenderam a arte de louvar, herdaram, também, dos anjos a Adoração, ato de fidelidade contínua, cujo som pode ser ouvido pelo Pai Maior, através dos hinos, dos clamores e, principalmente, das orações. Céus e terra proclamam a glória magnífica do Altíssimo, seja pelos sons da natureza - as brumas das águas oceânicas sendo arrebentadas nas rochas, na areia firme -, seja pelo canto infinito de milhares de pássaros, espalhados por todo mundo; seja pelo choro de um infante, ao nascer, mostrando que a vida apareceu em corpos sendo desvirginados pelo ar; seja pelo canto agudo da cigarra anunciando verões implacáveis! Os seres que Deus criou cantam das mais diversas maneiras. A vida não eclode em silêncio, mas em música; música que, sinestesicamente, pode ser perfume, aroma agradável, que sobe como oferta dadivosa para o Senhor dos Senhores. 

Seja Ele o motivo do seu louvor, pois Ele é o seu Deus, o que por vocês fez grandes e temíveis maravilhas que vocês viram com os seus próprios olhos.
Deuteronômio 10:21


Dos aplausos ao assovio do vento; das águas em queda livre das cachoeiras à complexa comunicação entre os cetáceos, que se dá, também, através de sons fantásticos, Deus está presente em uma de suas múltiplas formas, que é a música. Deus é música porque compreendê-Lo, em sua infinitude, reconhecê-Lo como único, acima e abaixo do firmamento - o Alfa e o Ômega -, e, principalmente, entronizá-Lo como centro emanador de todas as forças terrenas e cosmogônicas, é ter consciência de que sua canção, o hálito que dá sentido à vida de todos os seres, de todas as entidades e de todas as coisas, que existem, consciente e inconscientemente, em todos os planos da Criação, não terá fim, jamais. Sem canção, tudo caminha, inevitavelmente, à inércia; à morte, que consome todos, transformando filhos, filhas e criaturas em pó; na poeira estelar, que um dia, ontologicamente, foi, não é e não será nunca mais A canção do silêncio recolhe as notas musicais, desfaz as pautas e adormece os instrumentos. No entanto, a música continua em altiplanos não - visíveis por todos que são marcados pelo traço de finitude. A música que antecede a existência humana também continua a ressoar pelos espaços indecifráveis e inalcançáveis. Em ondas inaudíveis, é sombra do Espírito Santo que está em todos os lugares; onipresentemente musical. Deus legou à Humanidade, talvez, o mais belo dos segredos, pois a música, como parte integrante na história das gerações e gerações, que passaram pela terra, desde o conhecimento da Verdade, é filha do fogo purificador da deidade, que burilou a moldura que ornamenta a Criação. O louvor está em todos os lugares, pois a natureza, em sua sabedoria misteriosa, eleva seus cânticos belos, eternos e singulares aos ouvidos do todo poderoso Deus. Homens, mulheres, crianças e anciães entoam cânticos de louvor e adoração ao Altíssimo, pois todos são instrumentos vivos para que o Espírito Santo habite em milhares de templos de carne e osso e comungue, coletivamente, da melodia - mor, entre todas: a música do Amor.

"...falando entre vocês com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor..."
Efésisos 5:19


Elo perfeito entre as criaturas e o Criador, a música é a verdadeira aliança, que religa o visível ao invisível e o invisível ao visível; uma cadeia fantástica, virtuosa, alimentando e se retroalimentando, mutuamente. Em sons universais, o Pai Nosso, que está nos céus, através de suas misericórdias, acolhe todos que reconhecem sua grandeza em proteção e bênçãos. Ao inclinar seus ouvidos aos clamores e orações dos homens, Deus concede a dádiva de semear em cada coração, em cada existência, a semente promissora de dias cada vez melhores, e, também, longevos; e isto é canção! Entoada pelo Altíssimo, a melodia que não vemos, mas que atravessa nossos poros envasados, repercute e vibra nossa alma, que, em consonância com a espiritualidade, promove a verdadeira comunhão, que une céus e terra em espaços singulares. A música é a autora da adoração, que todos protagonizam (e que devem fazê-lo sempre!) quando se prostram diante da presença augusta de Deus. Sem adoração, música alguma teria sentido abaixo do firmamento, e a renovação diária, que o Espírito Santo realiza na vida daqueles que têm fé, desvaneceria. A música está na frequência modulada da fé; e a rádio FM da Fé tem um endereço inconfundível - o coração. Portanto, o verdadeiro louvor deve brotar do interior de cada um, pois adorar a Deus não se limita louvá-Lo apenas com os lábios, mas com o coração, que promove a harmonia, que deve existir entre os adoradores e o Adorado. Este coração não é apenas o órgão que está no mediastino; não é somente o músculo que bombeia o sangue para todo o corpo; mas, antes, é o que está cravado na alma de cada um, cujas batidas são mais do que a percussão dos tambores angelicais, são mais do que os címbalos vivos e dourados. Corpo, alma e coração formam o tripé da Adoração, que, modulada com a fé, eleva para os lugares mais cimeiros a melodia pura, a canção leve e a música santificada. Geminados e concebidos para contemplar a face do Pai, que recebe a oferta diária de seus filhos e filhas, a oração e o louvor se confundem; se fundem para se irmanarem na força que sustenta as cadeias espirituais, para além da compreensão de todos que foram marcados com o símbolo da morte até o advento da glória da segunda casa, quando outras canções serão entoadas e a música da Eternidade soará e ressoará para sempre, e toda a terra louvará, com lábios espirituais, o regozijante cântico da vitória. 

"Amém! Louvor e glória,
sabedoria, ação de graças,
honra, poder e força
sejam ao nosso Deus
para todo o sempre.
Amém!"
Apocalipse 7:12


Louvai ao Senhor. Louvai a Deus no seu santuário; louvai-O no firmamento do seu poder.
Louvai-O pelos seus atos poderosos; louvai-O conforme a excelência da sua grandeza.
Louvai-O com o som de trombeta; louvai-O com o saltério e a harpa.
louvai-O com o tamborim e a dança, louvai-O com instrumentos de cordas e órgãos.
Louvai-O com címbalos sonoros; louvai ao Senhor.
Tudo quanto tem fôlego louve ao Senhor. Louvai ao Senhor.
Salmos 150:1-6




Nota:
*Ruach é a forma transliterada da palavra hebraica espírito.

24 de fevereiro de 2012

O TEMPO DE DEUS!


Kairós x Cronos.


PORQUE NÓS SOMOS DE ONTEM E NADA SABEMOS; PORQUANTO NOSSOS DIAS SOBRE A TERRA SÃO COMO A SOMBRA. JÓ 8 : 9.

Angústia.


A angústia é, ao lado do medo, um dos sentimentos mais violentos que acometem o Homem desde o tempo de seu (auto) descobrimento no mundo, na  primeva condição como criatura, e, também, na qualidade sublime como Filho de Deus, pois os crentes e salvos em Jesus Cristo, ambivalentemente, experienciam os tremores e temores que a vida impõe, de uma forma singular. Esta singularidade, a que me refiro, restringe-se à consciência aguda daqueles que portam as insígnias dos evangelhos, e aprendem, ao longo da jornada, como representantes do Reino, o real significado dos valores, dos princípios, dos ensinamentos e dos preceitos ditos cristãos em oposição àqueles que elegem o livre arbítrio como estrela - guia, distante da vontade de Deus e, por conseguinte, reféns de seu corações dados a enganos de toda sorte.


A inconsciência do ímpio.


Na inconsciência em relação à própria vida, o estado de angústia é titanicamente voraz, e, desse modo, entorpece a todos que desconhecem as Escrituras Sagradas, e que, de forma inevitável, sofrem sem saber. A angústia, ainda, promove os perigos da deriva como se as pessoas fossem naus desaguadas em seus próprios desatinos, sendo tragadas por mares bravios e potencialmente mortais; reservando finais não muito felizes para suas vidas. Retrato agudo de almas, que, vazias, tentam encontrar o caminho da felicidade, mas são surpreendidas com abismos vivos, que sobrevivem às custas das desgraças alheias. O tempo da angústia parece eterno e a dor é o inimigo invisível com o qual não se pode lutar, pois batalhar contra o abstrato é tentar, em vão, esvaziar um oceano inteiro com as próprias mãos. Insanidade ou pesadelo?


A consciência do cristão.


Na outra ponta do novelo, a consciência, que é a forte aliada daqueles que seguem os mandamentos de Deus e exercem, de forma livre e com o regozijo na alma as palavras crísticas, não são poupados de quaisquer sensações ou dos estados de tribulação, que são eminentemente humanos. Paradoxalmente, para aqueles que não têm familiaridade com a Palavra Deus, que pensam convictamente que os cristãos estão guardados e protegidos em uma bolha de vidro impenetrável, indestrutível, estando, portanto, livre das intempéries da vida; isto constitui-se em uma visão míope e desacertada da vida daquele e daquela que segue a Cristo. A consciência permite ao cristão, através de vários processos, sejam racionais, sejam espirituais, que aquele perceba que ela é real, e que, sob hipótese alguma, pode e deve ser menosprezada. Os cristãos, como todas as outras pessoas, são seres humanos que padecem das mesmas dúvidas, passam por problemas semelhantes aos de outrem e enfrentam declives e depressões, ao longo de suas vidas. No entanto, a diferença entre aqueles que são regulados pelos ensinamentos bíblicos e os que preferem viver movidos por suas vontades libertárias e princípios filosóficos próprios está no fato de que a grande problemática não está ancorada na angústia ou medo, na coragem ou na desesperança, na tribulação ou na insensatez como costuma fisgar a mente e os atos dos ímpios, mas, antes, na capacidade de ver além do véu; i.e., do discernimento de todas as emoções, através da visão espiritual, que o cristão exercita, e, lamentavelmente, pelo encobrimento cada vez maior daqueles que se distanciam da convivência de Deus. Duas faces  que se antagonizam devido aos valores que elegem para facear o mundo - o justo e o injusto.


Tempo para todas as coisas!


Debaixo dos céus, há tempo para todas as coisas. Tempo para começar; tempo para terminar, como está escrito em Eclesiastes. E a Palavra de Deus, ao transmitir tão sábio ensinamento sobre o tempo, no qual o Homem é o agente e o paciente de todas as ações concorrentes, inclusive passando por momentos de felicidade, e, também, de sofrimento, em todos os sentidos; fatos de natureza rara, que abrangem o ato de viver com todas as suas nuances, e narrados de forma cristalina na Bíblia, no livro citado acima, e que mostra todas as situações pelas quais todos vivenciam, quer sejam os salvos, quer sejam os ímpios. E, neste sentido, as Escrituras Sagradas são contundentes ao asseverar em outro livro, nos evangelhos novos:


PORQUE FAZ QUE O SEU SOL SE LEVANTE SOBRE MAUS E BONS, E A CHUVA DESÇA SOBRE JUSTOS E INJUSTOS. MATEUS 5 : 45.


Esperar no tempo de Deus.


A igualdade, que vem do Alto, como espada, pesa sobre os ombros de todos, e que é, antes de qualquer especulação, dádiva única de Deus, comprovando a grandeza, a infinitude de seu amor e a eternidade de suas misericórdias a nos alcançarem gratuitamente. Os Céus, com efeito, é para todos; o paraíso pertence a todas as pessoas que intentam buscar a face do Altíssimo para ter com Ele uma vida de intimidade, de entrega total, de corpo, alma e coração, e, sobretudo de obediência irrestrita aos seus mandamentos. Mas, o que o tempo tem a ver com tudo isto? Aliás, é mister que se pontue nestas linhas que o tempo, apropriando-me do dito popular para dialogar com as máximas bíblicas acerca do referido tema, é o Senhor de Tudo. E sendo o Senhor de Tudo, antes, não se confunde com o próprio Deus, mas é a transcendência do Altíssimo, que as nossas vagas e limitadas mentes jamais conseguirão vislumbrar quão grande é a sua natureza; a sua essência, que está acima daquele que nos torna finitos: o Tempo.


Deus, o Inefável.


O tempo de Deus não é o nosso tempo, daí porque sermos reféns de todos os sentimentos e sensações que devemos (ou deveríamos) dominar, ter autocontrole, e que fazem parte da nossa constituição na condição de humanos, que somos; criaturas, por fazermos parte da Criação, em todo seu esplendor, e filhos do Senhor, pelo reconhecimento inequívoco da vinda de Jesus e de seu maravilhoso plano de salvação para as nossas vidas. Em primeira instância, por sabermos que harmonicamente os estados da alma, a razão e a fé compõem o arquétipo do Homem, e em segunda instância porque a falta ou a perda do domínio se deveu, é claro, pelo fatídico ato de desobediência, nos primórdios, transformando a pérola da Criação em uma verdadeira locomotiva desgovernada, que ruma em direção ao precipício, quase sem chances de ser parada. É nesta supertensão, que parece uma corda a asfixiar pescoços em série, em inumeráveis forcas, que descobrimos, quando sabemos que o tempo não é nosso, e, sim, do Senhor; que o tempo, ainda que saibamos que não nos pertence, mas, antes, à esfera suprema e divinal do poderoso Deus, é, com efeito, somente Dele, é que devemos potencializar o nosso sentido de vigilância interior para que não sejamos, de forma torpe, enganados pelo próprio coração - morada dos nossos desejos mais infames, paraíso às avessas, que ultraja anjos ao doce sabor das vaidades humanas. Pecado?


O equilíbrio.


O móvel chamado Angústia, inflacionado pela ansiedade, que nos devora por dentro, é, desse modo, a turbulência que pode desestabilizar a balança, que está internalizada em nosso ser, cujo equilíbrio ideal advirá da serenidade e da observância do cristão, que, por sua vez, deverá buscar incessante e incansavelmente, em relação à realidade na qual está inserido, a presença constante do Espírito Santo, a coluna de fogo a nos guiar, pois, através do discernimento, apontará as instâncias alvas e diáfanas, que revelarão, na essência, a mensagem que vem do Alto, seja pelas respostas das orações, seja pelo exercício de escuta da voz de Deus, ou pelo derramamento das infinitas misericórdias de Deus em nossas vidas. É nesta busca necessária que o sentido das coisas do Alto fará com que a visão do cristão acerca do mundo celestial perceba e compreenda, sem desvios, no mundo espiritual, a vontade soberana e inquestionável de Deus. A insondável essência do Criador é, neste sentido, a manifestação inconfundível, para o verdadeiro filho de Deus, do Tempo que vem de cima; do Inefável, da presença do Altíssimo que se confunde com o Tempo, que pensamos ser o tempo, mas que, em verdade, não é; mas, antes, os mistérios da Eternidade, que eclode para todos os seres, através da palavra, seja o lógos imanente, seja o verbo transformado em carne.


Alfa - o princípio - Õmega, o fim.


Deus não tem tempo. Deus é atemporal. É o príncípio e o fim de todas as coisas, inclusive de Si mesmo. A Sua circularidade, encerrada no mistério, que jamais será desvelado, é a manifestação do evento, no qual a deidade se confunde com o próprio tempo. Tudo é a partir Dele e para Ele retorna, de forma implacável. Lei imutável, pétrea e eterna. Há tempo para todas as coisas debaixo do céu, imergindo na palavra de Eclesiastes, mas não há e não haverá, em tempo algum, tempo para o que existe acima do céu, porque lá existe somente uma entidade: a de Deus. E sendo Deus o Criador, Supremo e Único, o tempo de Deus não existe, o tempo de Deus é; este tempo, permanente, contínuo e inesgotável é o Kairós. E é na esfera do Kairós que devemos, todos, afinar nossas débeis compreensões para exercer a temência plena, a obediência inquestionável e a humildade humana - índices que aumentam a nossa sensibilidade para que no mundo espiritual alonguemos nossas visões, testemunhemos a plena vontade do Pai e ouçamos,  na intimidade com o Espírito Santo, a mensagem cristalina verbalizada voz de Deus.


Kairós, o Tempo de Deus.


O Kairós é o determinante e não o determinado; é o que funda e não é o fundado; é o que decide e não é o decidido; é o que transforma e não é o transformado. Acima do céu, o Kairós paira soberano, denso e eterno; abaixo do céu, o Cronos envolve toda a terra e a criação de Deus, que jaz sob a maldição do pecado e da morte, que veio para apartar, momentaneamente, a Criatura do Criador. Este é cenário mais contundente, que denuncia, para além do hiato, que nos separa de Deus, a nossa natureza exemplar: a finitude, que devolve à terra o barro de onde, um dia, saímos; e a existência, que, efêmera, volta para os braços do Pai, se aceitarmos o plano da Salvação em sua totalidade. Desse modo, ao sermos regidos pelo Cronos, somos devorados, pouco a pouco, desde o dia do nosso nascimento. A partir do nosso surgimento, a nossa existência desfia como fio que se perde e se desfaz na poeira das horas, dos minutos e dos segundos, como a areia que voa  e se dispersa ou como o vapor que se desfaz no ar; é o trajeto silencioso do nosso desaparecimento.


Cronos, o tempo do Homem.


O tempo de Deus não nos pertence. Somos dele pacientes e não agentes. O Cronos também não nos pertence, embora pensemos que o seguramos em nossas mãos como se fosse as rédeas de um corcel platinado, que segue seu rumo sem obedecer a comando algum ou ao desejo de qualquer mortal em searas terrenas. O tempo de Deus engole o tempo dos homens. Cronos é apenas uma  sombra da própria morte travestida, e que, um dia, também, como as criaturas, padecerá na consumação dos séculos; quando, então, restará somente o tempo da deidade, a presença excelsa e magnífica do Altíssimo no resplandecer da própria Eternidade. Eis, portanto, a chave do grande mistério: a esperança que devemos ter está na fé cultuada em um tempo que prepondera sobre nossas vidas, minúsculas e limitadas perante Deus. E ter esperança nada mais é do que esperar; esperar pacientemente; é ter a certeza de que as coisas se cumprem, segundo a vontade do Senhor, nos domínios imensuráveis do Seu tempo, pois, no silêncio eterno de Kairós, Deus se faz pronunciar em todo universo, no âmago da Criação e nos termos do Abismo. Diante de sua majestade e glória, as coisas, os seres e seus filhos se prostram para receber do Alto, através da misericórdia, a lei divina na qual sempre esteve predita que o Tempo, o verdadeiro Tempo não tem começo nem fim; não é marcado por ponteiros, não atrasa e nem tampouco adianta. O Tempo é; o Tempo acontece porque o Tempo é o legítimo Senhor de todas as coisas, pois nele Deus se faz presente, eternamente passado, eternamente futuro. Alfa e Õmega se conjugam na ventre da Eternidade.


A morte e a vida.


A nossa memória deve ser edificada em uma premissa angular. Qual seja: ainda que a Vida conheça o desenlace da Morte, a vontade augusta de Deus predomina sobre toda Criação, pois o tempo de Deus - Kairós - reina sobre o triunfo da vida e sobre o aguilhão da morte. O Cronos? Este jamais existiu e jamais existirá; é uma grande ilusão de ótica para que os homens e as mulheres na terra não caiam em desgraça e formem legiões infindas de desesperados a caminharem errantes sobre o fio da navalha, que é a Vida, imponderavelmente bela, mas paradoxalmente cruel. 

4 de outubro de 2011

AMAR A DEUS NÃO DÓI!



"Nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus: quando amamos a Deus e guardamos os seus mandamentos.
Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; e os seus mandamentos não são penosos..." 1 João 5 : 2 - 3.

As palavras de São João estão baseadas no princípio universal do AMOR.  O tratamento que o apóstolo dispensa ao tema do Amor e suas implicações plausíveis para aqueles que acreditam em Deus são fundamentais para a compreensão do advento da Salvação na vida dos crentes e a relação de coerência entre a prática do amor ao próximo e aquela referida, stricto sensu, ao relacionamento com o Altíssimo na condição de filhos legítimos, que herdaram o direito do amor Daquele pela morte de Jesus Cristo, num calvário injusto e numa cruz maldita.

A premissa do amar a Deus é distinta do fenômeno que nos transforma quando nos tornamos os arautos do amor e sua expressão altaneira em relação à proximidade; i.e., todos que desconhecem a Palavra de Deus e, portanto, ignoram o verdadeiro sentido do Amor. A impressão incial, neste sentido, parece ser a da liberdade alcançada com o advento da Graça, além dos males que nos escravizaram antes da consciência sobre o evangelho vivo de Cristo, na terra contaminada pelo pecado, ainda original. Assim, a perseguir esta ótica falseada da realidade, o amor estaria livre de quaisquer amarras, e o mundo, conseqüentemente, seria um estado contínuo da ação do Amar, conjugado em infinitivos pessoais e impessoais - um rascunho possível da Utopia. Mas esta ambiência idealizada é um impedimento natural para o cumprimento de todas as sentenças bíblicas sobre o tempo da Graça, seus desdobramentos previstos, com o fim dos tempos, bem como a dificuldade de se amar em um mundo que está mergulhado na atmosfera do Mal. O paraíso dista, ainda, dos olhos daqueles que nasceram de novo, e que esperam, fortalecidos na fé, o dia do juízo e o da consequente coroação de todos os Filhos de Deus como habitantes da nova Jerusalém.

Amar a Deus, em direção contrária a todas as leis regentes no mundo dos homens,  impõe, de forma inequívoca, um aparente paradoxo. Qual seja: se o conhecimento da verdade é a condição para a libertação da alma de todos os elos que mantinham aquela presa a uma realidade fadada à desgraça, como pensar em uma liberdade, que tem como condição prima um ato do qual não se pode refutar? O mistério se revela e o paradoxo se desfaz, elevando a consciência e a alma humanas  para um plano singular, cuja pertença é a do espírito santificador e purificador de Deus. Antes de amar a Deus é necessário obedecer a Ele. Obediência é a palavra de ordem; e, desse modo, emana da vontade soberana do Pai, que a transmite a todos que creem e amam a sua Palavra, de forma inconteste.

Pais existem para amar seus filhos. Filhos existem, também, para amar seus pais. Cabem aos pais o cuidado, o zelo e a proteção dos filhos; todavia, cabem aos últimos o exercício da obediência àqueles, constante e ininterruptamente. Esta é a relação vital para que o jogo de forças, que mantém o equilíbrio nas relações pais-filhos, promova a expansão sem medida deste sentimento, que, por sua vez, ao ultrapassar os elos da dependência natural e necessária, abre cadeias, rompe fronteiras e produz vida, além da existência finita que nos caracteriza nos limites do Universo aparente e nas bordas dos mundos essenciais, pois o amor é o gerador de todas as coisas, seres e enigmas guardados na consciência divina.

Guardar os mandamentos de Deus, segundo as palavras de São João, é selar a relação de cumplicidade entre os filhos que amam o Pai, preservando a vontade soberana do Altíssimo, e delegando a Ele toda sorte de desígnio para que a direção de nossas vidas esteja explícita e irrestritamente em suas mãos, dadivosas, acolhedoras e misericordiosas.  Cumplicidade que se completa na escuta do Espírito Santo, que nos envolve e nos indica, através do sobrenatural, qual caminho devemos / deveremos trilhar como seguidores do Cristo, o primogênito de Deus.

Amar a Deus implica guardar seus mandamentos. A guarda é o estado de vigília, em silêncio, no qual a oração é a bússola que norteia a busca pela presença Daquele, através da perseverança em dialogar com o Pai; nas atitudes que consagram a vida de um cristão autêntico, e, principalmente, obedecendo às ordenanças do Senhor, que entregou à morte de cruz o seu único filho no lugar da humanidade inteira para que todos tivessem o direito inalienável da Salvação. Assim, Deus, em sua grandeza, não pensou; antes, agiu, e o fez em segredo, desde que Moisés fora retirado do seio da realeza egípcia para iniciar uma trajetória épica, e que culminaria na vinda do Messias, quase dois milênios, após a escravidão de um povo marginalizado, e que era denominado como o povo que vivia à margem de um certo rio: os Hebreus. A saga de um sonho, que fora, em verdade, uma promessa fundada em profecias, em épocas distintas, na história dos Hebreus, para atingir o cumprimento da Palavra, em sua totalidade, com o advento da vida do próprio Cristo, em carne e osso.

Eis a oportuna indagação: doeu em Deus quando ele deu aos homens da terra o seu filho, o seu único filho, Jesus Cristo, para morrer, de forma cruel e vergonhosa, pendurado num pedaço de madeiro, sem nunca ter cometido um pecado sequer? Não doeu; e todos nós sabemos disto, e esta resposta é tão sólida quanto o advento da crucifixão da qual o Filho de Deus não pôde escapar porque o que estava escrito acerca do Cristo tinha de se cumprir para que todos nós nos livrássemos da morte eterna.

Ora, se Deus não sentiu a maior dor de um pai ou de uma mãe, que é a de perder seu único filho para um propósito universal, que foi a consolidação do Plano da Salvação até à consumação dos séculos, por que sentíriamos qualquer tipo de incômodo ou algum tormento em nome do nosso amor ao Pai, que é, simplesmente, a obediência a seus mandamentos? Guardar seus mandamentos não é fardo ou algo penoso para seus filhos. Ao contrário, é carga leve; é regozijo; é viver o evangelho da Graça, em toda sua plenitude! Guardar os mandamentos de Deus é obedecer; e obedecer não dói! O tempo da Graça é o tempo da liberdade, mas a liberdade para o cristão exige renúncia, mudança de comportamento, novos modos de pensar; regras que devem ser coadunadas com prática de uma vida transformada a partir de uma consciência clara, ampla e permanente sobre o valor do Evangelho e seus princípios que, efetivamente, guiam os Filhos de Deus pelo caminho da retidão, e que, em última análise, é o itinerário da Verdade.

A obediência aos mandamentos de Deus não significa morrer como Jesus Cristo morreu: execrado, humilhado e sacrificado. Mas a desobediência, ato contínuo, gera a morte: a morte física e a morte eterna. Estado da desgraça sob o véu imutável da Eternidade. 

Amar a Deus é compartilhar com o Pai da própria Eternidade; amar a Deus é obedecer às suas ordens conduzidas pela Fé, inquestionavelmente; é ser cúmplice das primícias do Espírito Santo, que nos garante a verdadeira felicidade, e que só interessa àqueles que realizaram com o Senhor o maior de todos os anelos: o Concerto do Amor. 

23 de agosto de 2011

QUANTO VALE UMA CRUZ?


Tendenciosamente mal, o Homem, ainda escravo de uma herança primeva, que fora o pecado adâmico, e que assolou toda a Humanidade, sabe que o acesso à restauração plena de si, no plano da Criação, é o reconhecimento indelével do Cristo crucificado, morto e ressuscitado, em sua vida, através do advento da conversão. No entanto, a compreensão míope das pessoas acerca do advento do Cristo Jesus como elemento redentor, apresentado nos evangelhos dito novos, é o movél, em desvio singular, na atualidade, e que, lamentavelmente, faz parte da conduta descompromissada, equivocada, e, em última análise, comprometedora das pessoas que não se comportam à altura do Filho de Deus, que tivera a pior morte que um ser humano poderia ter tido.

Destarte, o desnível entre o episódio crístico, que fora a morte injusta do Messias na cruz, representando, para além do cumprimento das diversas profecias, o fim da era do pecado, e a falta da prática de muitos, que se proclamam cristãos, nos dias atuais, e que, irreverentemente, não dão a devida importância para o sacrifício do Homem sem pecado no Calvário, no lugar da Humanidade, assombra aqueles que sabem o real significado da palavra escândalo e das admoestações bíblicas sobre a apostasia, a conduta ilícita, a perversão dos princípios, e, finalmente, da aparência do Mal, que ainda tenta triunfar sobre o Bem.

Ter fé é ter consciência de que os valores espirituais, que o Homem herdou nos tempos da Graça, com a consolação do Espírito Santo, não devem ser jamais corrompidos; caso contrário, os cristãos perderão o direito de serem os legítimos guardiães, vigilantes, e, em última instância, as sentinelas vivas da palavra de Deus, no reino estabelecido no mundo e no paraíso renovado nos céus.

14 de agosto de 2011

A BUSCA DA SANTIDADE




"Portanto, se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus.
Pensai nas coisas que são de cima e não nas que são da terra;
Porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus."  
                                                                                                   Colossenses 3 : 1 - 3.


As palavras do apóstolo São Paulo, dirigidas aos Colossenses, impressionam, sobremaneira, aos leitores das Escrituras Sagradas pela reflexão que aquele protagonizou, à época, pela exortação feita àquele público, e, conseqüentemente, pela extensão daquela aos dias atuais, em que a Graça parece dar sinais nítidos de que seu tempo está no fim.

São Paulo, ao exortar os cristãos naquele momento, e de forma contundente, objetivou sua mensagem no evento que compreendeu a morte e a ressurreição de Jesus Cristo, já prenunciada pelas escrituras. Assim, a divindade que tomou a forma humana, morreu crucificada, e ressuscitou três dias após sua injusta execução, cumprindo a profecia messiânica, vaticinada pelo profeta Isaías, há, aproximadamente, 700 anos atrás, representa, para os cristãos que se converteram e para aqueles que ainda ouvirão as Boas Novas, no milênio, a morte individual de cada um, através de um sacrifício singular, e a ressurreição, em vida, para gozar dos direitos inalienáveis do Reino, estabelecido na terra.

Na conversão, o reconhecimento, a redenção e o devido aceite de Jesus Cristo, como único e suficiente salvador na vida da criatura, garantem, de imediato, a passagem  do plano terreno para o plano espiritual. Assim, não mais consideradas como criaturas, mas filhos do Criador, homens e mulheres podem ser, com efeito, chamados de cristãos, na acepção mais genuína do termo.

A morte em vida, um paradoxo aparente, na trajetória do cristão, não significa dor, tragédia, e tampouco desgraça, pois esta última está sobre aqueles que não aceitam, desconhecem, ou que, por vontade própria, preferem viver no mundo sob o estado de liberdade inegociável, recusando, repulsiva e compulsoriamente, o Plano da Salvação, para a tristeza de Deus. Ao contrário: morrer em vida é morrer para este mundo, que está sob a esfera da malignidade e corrompido pela herança maldita, que fora o pecado adâmico. Logo, ao morrer em vida, o cristão verdadeiro inclui, em seu vocabulário diário, a palavra RENÚNCIA. Este é o sacrifício singular, referido nesta breve reflexão. A renúncia, para o cristão, é sinônimo pleno de consciência; da consciência cristalina de que as coisas dessa terra e desse mundo não pertencem mais à sua realidade, pois são ilusórias, efêmeras, e, portanto, não assegurarão um lugar na Eternidade, ao lado do Pai. Tais coisas, sem delongas, são, incontestavelmente, o passaporte para o inferno.

Uma vez ressuscitado pela consciência, e tendo a certeza de que este mundo se desmoronou juntamente com seu passado de velha criatura,  o cristão, sob o estado da Graça, que superabunda e solidifica a fé, migra da cegueira atlântica, que o acometia, antes de conhecer a Jesus Cristo, para a visão espiritual completa, cujos olhos contemplam o Reino de Deus, aqui na terra, até o dia do arrebatamento da igreja ou o dia do juízo, em que todos os cristãos, definitivamente, viverão na Nova Jerusalém.

Ao ingressarem no Reino do Senhor, que prega o amor, a justiça, a paz; e toda sorte de virtudes, que emanam do Espírito Santo, os cristãos têm a certeza imbatível de que, mortificados em Cristo, esses têm suas vidas escondidas, guardadas, protegidas e preservadas na rocha, que é o próprio Jesus Cristo. Este nome, sim, é a senha de acesso infalível para adentrar o Paraíso, e a única sentinela do assento de todos os cristãos, que, um dia, estarão sentados, todos juntos, à direita do Altíssimo nos céus.

Pensar nas coisas de cima é um apelo profético ao desprendimento de tudo aquilo que é terreno, do que é material e de todas as coisas que vilipendiam o Homem, seja em prisões espirituais, seja em grilhões carnais, onde a pseudoliberdade, em sua essência, não passa de uma jaula eterna e mortificante, sem qualquer direito à escolha. A aparente liberdade é a encarnação do próprio vício, da corrupção e da degradação daquele sobre a terra. É, em última análise, a cruz invertida, que não fere a carne, mas que sangra a alma, tragando-a para o abismo sem fim.

A intimidade com o Pai, através da vida de seu filho - Cristo, o Messias -, timbra a vida do cristão com a marca inconfundível da liberdade que aquele tem em relação às coisas do mundo. Neste sentido, o verdadeiro cristão, para viver uma vida de santidade, segundo a exortação paulina, deve apartar-se do mundo para que possa herdar o direito legítimo à vida eterna, e se transformar em pássaro de luz; arauto das Boas Novas, vindas céus. 

Da morte à ressurreição, da consciência sobre o verdadeiro sentido das coisas do Alto à renúncia de uma vida desmedida, o ensinamento paulino versa sobre a busca da santidade; e esta última é somente alcançada quando o cristão permite, em instância final, que Jesus Cristo entre em seu coração e reine soberano como Nosso Senhor.

6 de julho de 2011

SALMO 139



 Senhor, tu me sondaste, e me conheces.

Tu conheces o meu sentar e o meu levantar;
de longe entendes o meu pensamento.

Esquadrinhas o meu andar, e o meu deitar,
e conheces todos os meus caminhos. 

Sem que haja uma palavra na minha língua,
eis que, ó, Senhor, tudo conheces. 

Tu me cercaste em volta, 
e puseste sobre mim a tua mão.

Tal conhecimento é maravilhoso demais para mim; 
elevado é, não o posso atingir.

Para onde me irei do teu Espírito, 
ou para onde fugirei da tua presença?

Se subir ao céu, tu aí estás; 
se fizer no Seol a minha cama,
eis que tu ali estás também.

Se tomar as asas da alva
se habitar nas extremidades do mar,
ainda ali a tua mão me guiará
e a tua destra me susterá.

Se eu disser: 
Ocultem-me as trevas; 
torne-se em noite a luz que me circunda;

nem ainda as trevas são escuras para ti, 
mas a noite resplandece como o dia;
as trevas e a luz são para ti a mesma coisa.

Pois tu formaste os meus rins;
entreteceste-me no ventre de minha mãe.

Eu te louvarei, 
porque de um modo tão admirável e maravilhoso fui formado; 
maravilhosas são as tuas obras, e a minha alma o sabe muito bem.

Os meus ossos não te foram encobertos, 
quando no oculto fui formado
e esmeradamente tecido nas profundezas da terra.

Os teus olhos viram a minha substância ainda informe, 
e no teu livro foram escritos os dias, 
sim, todos os dias que foram ordenados para mim,
quando ainda não havia nem um deles.

E quão preciosos me são, ó, Deus, o teus pensamentos!
Quão grande é a soma deles!

Se eu os contasse, 
seriam mais numerosos do que a areia;
quando acordo ainda estou contigo.

Tomara que matasses o perverso, ó Deus,
e que os homens sanguinários se apartassem de mim,

homens que se rebelam contra ti,
e contra ti se levantam para o mal.

Não odeio eu, ó, Senhor, aqueles que te odeiam?
E não me aflijo por causa do que se levantam contra ti?
Odeio-os com ódio completo;
tenho-os por inimigos.

Sonda-me, ó, Deus, e conhece o meu coração;
prova-me e conhece os meus pensamentos;

Vê se há em mim algum caminho perverso
 e guia-me pelo caminho eterno.



                                                                                                                  

23 de junho de 2011

AMOR, SUBLIME AMOR!


"Eu tenho tanto pra te falar/ mas com palavras não sei dizer/ como é grande o meu amor por você..."
                                                                      Roberto Carlos / Erasmo Carlos

Quem não se lembra desses versos que, efetivamente, se tornaram clássicos no repertório da música nacional? Palavras que traduzem a dimensão do mais nobre dos sentimentos humanos: o Amor. Amor que pode ser dito de várias maneiras, que pode transcender mundos e existências, e, que, indelevelmente, fora a centelha que gerou a vida nos milhões de mundos que Deus criou na cena dos primórdios.  
O tema do Amor, portanto, é universal. Sem fronteiras e sem limites, quem poderia definir o que é realmente o Amor? Penso que a tarefa, hercúlea por excelência, resvalaria, indubitavelmente, para um vácuo sem fim. Assim, é lei pétrea de que os seres humanos não são capazes de compreender a natureza, a necessidade, e, sobretudo, a permanência do Amor, porque, paradoxalmente, embora esses atores sejam os portadores da força que engendrou a existência de todas as formas animadas e inanimadas, a partir do Nada, essas personagens são, também, debéis para plenificar e construir a equação divina do Amor, pois todos nós somos frutos coletivos de um amor que nasceu no coração de uma entidade suprema; de um ser ubíquo, que já era, é e sempre será: DEUS. Não geramos o Amor, mas fomos gerados por este, através da vontade suprema do Pai que está nos céus. Éramos eternos no paraíso edênico, portanto, éramos perfeitos. Entretanto, na evolução de nosso dna, corrompido pela queda adâmica, não restou nada do amor original. O pecado nos tornou criaturas fragilizadas, e a capacidade de amar e ser amados, por conseguinte, vacilou, para a desgraça e a errância da Humanidade. 
Destarte, quaisquer tentativas para abarcar o ilimitado Amor é potencialmente similar à ideia de um grão de areia que se perde para sempre no espaço sideral. Nós somos o grão de areia. Ínfimo, limitado e perecível. O Amor é diametralmente oposto: é imensurável, infinito e eterno, pois o próprio amor se confunde com a essência do Criador - inesgotável porque mantém a complexa dinâmica do universo e contínua para proteger a criação dos possíveis desvios que poriam em risco a sobrevivência da obra da inteligência absoluta.
 A miopia, portanto, é a condição física de que dispomos para vislumbrar a substância poética, que é o Amor, e que verte pujantemente do seio do Deus, alcançando-nos de diversas formas e concedendo-nos o renovo diário, através da indissoluta misericórdia -  um dos atributos primos da deidade.
Platão, um dos maiores filósofos da antiguidade clássica, não excluiu do pensamento o excelso plano da divindade nem tampouco desprezou o lugar do Homem na realidade; antes, ao revelar a verdade, que define o ser dos lógos no mundo, com efeito, o ilustre pensador, implicitamente, indicou o possível tópos onde está o Criador. No Mito da Caverna, o que vemos, segundo Platão, são sombras projetadas na parede. O Homem, segundo o filósofo, é imperfeito o bastante tanto para contemplar a verdadeira natureza das coisas, em sua essência fundamental, quanto para contemplar a possível face de Deus. Logo, a poderosa luz, que projeta tudo que existe e pulsa vida, e as coisas, em sua morfologia completa, não podem ser testemunhadas por nós, os mortais, que temos de aceitar a nossa torpe condição por, um dia, num passado remoto, termos participado do pacto maldito da desobediência. À nefasta traição e infelidade com o Criador, seguiu-se a quebra do elo que nos mantinha unidos às mais altas esferas celestiais, e iniciou-se, para a desgraça do Homem, a eterna noite que nos cobriu e nos afundou em sombras densas, fantasmagóricas e mortais.
A cobiça semeada no coração adâmico aniquilou a essência do Amor e seu efeito químico. A incompreensão do mais belo dos sentimentos e que se confunde com a natureza do Criador transformou o Homem num ser bestial, cego, impulsivo, egoísta e destruidor. Assim, a primícia da Criação sentiu na própria pele o sabor amargo da solidão, e maculou, para sempre, a imagem que o tornava semelhante a Deus. Perdido e errante, marcado e arrependido, o Homem esqueceu o que era o Amor, esqueceu o que era amar, e, consequentemente, não podia ser mais amado. Soubera, um dia, que Deus o amara, mas, lamentavelmente, olvidara-se do amor incondicional do Criador em relação às criaturas.
O amor de Deus é sublime porque transcende as dimensões corpóreas; é inexplicável sob regras humanas; é singular porque é único; é soberbo porque é grandioso; é insigne, excelente, e, claro, perfeito. Este é o amor incondicional sobre o qual temos lapsos longínquos na memória, e que perdemos quando as cadeias foram rompidas. Amor que mantinha nossos corpos e almas em permanente estado de gozo espiritual e em comunicação perpétua com o Criador. Força suprema que irradiou a luz primeva e nos coroou como o centro na obra máxima de Deus: a Terra.
As Escrituras Sagradas, sobretudo no Novo Testamento, apresentam extratos cimeiros sobre o Amor; e é na figuração do Cristo Jesus que o Amor se funde nos ensinamentos,  na vida, e, principalmente, na passagem do filho de Deus na terra para trazer ao Homem a mensagem dos tempos perdidos: a verdade divina e imutável sobre o amor incondicional, que emanou do coração do pai celestial.
Nessa diretriz, portanto, coube ao apóstolo do Amor, o evangelista João, a imperiosa missão para transmitir as palavras messiânicas sobre o amor incondicional, e que são cristalinas no texto emblemático intitulado Jesus: A videira verdadeira. Relata-nos o apóstolo:

       Como o Pai me amou, assim também eu vos amei; permanecei no meu amor.
       Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor;
       do mesmo modo que eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai
       e permaneço no seu amor. 
       Estas coisas vos tenho dito para que o meu gozo permaneça em vós,
       e o vosso gozo seja completo.
       O meu mandamento é este: que vos amei uns aos outros
       assim como eu vos amei.
       Ninguém tem amor maior do que este, 
       de dar alguém a sua vida pelos seus amigos.
       Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando. 
                                                                                              João 15 : 9 - 14.

A condição do Amor é, nas palavras do próprio Jesus, na letra joanina, a preservação dos mandamentos do Pai. E guardar seus mandamentos é retornar ao ato de obediência, de cuja prática a Humanidade se distanciou; e que o tempo maravilhoso da Graça apela para o retorno da audiência e do cumprimento das palavras de Deus, transmitidas aos discípulos de Cristo no Novo Testamento. 
Este é, indelevelmente, o princípio absoluto para que o elo se restabeleça entre o Homem e Deus, através de Cristo Jesus, pois a plenitude do amor universal é a força sublime que nos arrebata para as dimensões do espírito afim de que alcancemos, no coração do Pai, sua vontade soberana: amar ao nosso próximo como Seu filho, um dia, nos amou. Lição de vida, ensinamento de morte, pois o sublime amor, que flui da essência do Criador, na representação do Grande Eu Sou, é o amor dadivoso; é aquele que subtrai a própria vida em deterimento da de outrem.
Deus nos amou quando nos criou. Deus nos amou quando permitiu que Seu filho, sem máculas, sem pecado, fosse morto, pendurado e sacrificado numa cruz para que a Salvação atingisse a todos, indistintamente. E o amor do Pai, que ficara órfão de Seu próprio filho, por nossa causa, continua sublime e incondicional. Como compreender tal atitude e que nos precipita nos limites da loucura?
Estamos míopes para contemplar a face de Deus, ainda; mas não estamos loucos para receber os ensinamentos crísticos e aprender a amar a todos, da forma como Ele nos amou e nos ama, até à consumação dos séculos. Somos pecadores, mas o Amor nos torna tão sublimes como o Monte Olimpo, o mais alto que existe no universo vísivel para esta humanidade, e que não está na Terra, mas em Marte.
Os belos versos da canção, que iluminaram este texto, não são declarações do Pai proferidas a seus filhos, mas, com efeito, podem ser nossas palavras de amor ao reconhecimento àquele que nos deu a vida e nos ama incondicionalmente, ainda que tropecemos, ainda que falhemos!
Como bem diz o evangelho de João, guardemos os mandamentos de Jesus; obedeçamos à  boa e necessária ordem que vem do Alto: amemos ao Pai, mesmo que não tenhamos palavras para expressar tamanho amor; amemos ao próximo, pois esta é a mais perfeita oração que alguém pode proclamar aos homens e a Deus, pois, desse modo, formaremos a grande ciranda da amizade, e as correntes serão elos vivos de um amor puro, singelo, único e transformador.
                      

7 de novembro de 2010

A ESPERANÇA É ÚLTIMA QUE NÃO MORRE!



            Se basearmos nossa visão de mundo em uma concepção de que o último dos sentimentos mais importantes é o derradeiro a perecer – a esperança -, qualquer que seja o The Day After, com efeito, seríamos uma legião de atormentados rumando para os nossos próprios abismos.
A ideia basilar, portanto, de que a esperança é a última que morre, não condiz com o pensamento cristão, cuja prática se renova diariamente, através do advento absoluto da graça, demarcado pela aparição e glória do Messias – o Cristo, unigênito de Deus.
            Pelo turno da tradição clássica, que funda o conceito da possível morte da esperança, que advém da mitologia grega, quando Pandora, ao abrir a temida caixa, para desespero de Zeus, apavora-se, ao perceber a fuga de todos os males, de todas as doenças, de todas as mazelas, que assolam a Humanidade, desde o seu primórdio, segundo o mito helênico que trata de uma das etapas da criação do mundo, clarifica-se, por um lado, para os ocidentais, a noção de que, embora a deusa da narrativa mítica em questão encerre na caixa, aprisionando, ad eternum, o último dos sentimentos - a esperança -, esta última, provavelmente, um dia, morrerá.  A priori, pesa sobre esta legenda mítica uma dubiedade terrífica. Qual seja: a esperança guardada na caixa, para a felicidade dos mortais, garante a salvação do mundo contra todas as tragédias e desgraças que possam acometer o Homem e sua raça, à semelhança dos deuses olimpianos, à primeira vista. A posteriori, entretanto, mergulhando na raiz da verdade, que radicaliza a mensagem cifrada do mito como narrativa histórica, revelamos a voz recôndita e fossilizada no dito popular conhecido por “a esperança é a última que morre”. Não obstante, a desleixada Pandora ter evitado o apocalipse antes de seu próprio fado, como evento escatológico, depreende-se, portanto, que, um dia, para a desgraça dos mortais, aquela que nos salvou no passado, desafortunadamente perecerá, deixando homens e mulheres presos nas garras do fim dos tempos. Seria, porventura, este dia, o horrendo Armageddon, tão propalado nos últimos tempos?
            Ora, se a esperança há de morrer, indelevelmente, em um futuro sombrio, quando o sol e a noite se confundirem e a aurora nunca mais nascer no horizonte, enterrando, para sempre, o tempo da felicidade, e fazendo surgir a era das dores eternas, por que, então, a nossa heroína Pandora a manteve protegida em uma caixa, se a divindade sabia que tudo acabaria com a sua morte?  
            Nem os gregos, nem os romanos, e tampouco, ainda, aparecera alguém na terra capaz de dar solução ao axioma lançado por um mito que caminha perigosamente sobre o fio da navalha.  Em verdade, a dúvida inexiste nos evangelhos, sobretudo na seção neotestamentária, que aborda a questão concernente à esperança, sua natureza e sua importância na mensagem das boas novas; e, por conseguinte, como rubrica emblemática da Era da Graça e sua permanência em tempos atuais.
            A esperança não é a última que morre porque ela não morre jamais. Esta, sim, deve ser a leitura crística sobre a esperança; seu status, e, principalmente, seu papel como fundamento no Novo Testamento, e para aqueles aos quais as palavras genuínas da salvação são endereçadas, através de uma mensagem que firma suas bases, de forma inequívoca, sobre o amor, a fé, e, claro, sobre a esperança – nosso objeto de defesa e releitura do elemento mítico, à luz das Sagradas Escrituras, na presente explanação.
            Em sua epístola escrita aos Romanos, o apóstolo Paulo nos diz:

                                Porque, em esperança, somos salvos. Ora a esperança que se vê
                                           não é esperança; porque o que alguém vê, como o esperará?   
                                           Mas se esperamos o que não vemos, com paciência o esperamos.
                                                                                                                             (Romanos 8 : 24 – 25)

            A partir da letra paulina sobre a esperança, que revela a sua imortalidade, além de derrubar o mito de que aquela é o último sentimento a desaparecer na falível caixa da deusa Pandora, e, assim, dar cabo à espécie humana e ao mundo, o referido apóstolo, que reforma o evangelho de Cristo, atualizando-o em seu tempo e ratificando a atemporalidade das palavras proféticas do homem de Nazaré, estabelece o verdadeiro padrão para que a salvação alcance a todos aqueles que crêem no filho do Deus altíssimo, que fora sacrificado na cruz para que a Humanidade pudesse gozar da eternidade plena no paraíso promulgado pela carta testamentária do apóstolo São João, intitulada Apocalipse.
            A esperança, desse modo, nas palavras de São Paulo, é uma das manifestações da Graça, na qual todos os crentes em Jesus Cristo são efetivamente salvos; e a fé, o motor que move os corações crédulos, sobretudo os que não viram a Cristo, escuda outra força potente, inesgotável, e, eterna: a própria esperança. Logo, as Escrituras Sagradas liquidam, de vez, a legenda que vaticina a morte da esperança por ter sido o único elemento que não escapou da fatídica caixa de Pandora. A esperança está mais viva do que nunca assim como a palavra de Deus, que ancora a salvação dos crentes no Cristo messiânico, tendo aquela como ator principal nesse processo redentor, que é o legado da salvação, e, conseqüentemente, a posse do direito de estar ao lado de Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo, no paraíso celestial.
            Quanto ao mito de Pandora e a sua caixa mítica, só nos resta afirmar que nem a deusa desobediente e nem a sua caixa divina sequer existiram no mundo espiritual ou no mundo material, segundo a mitologia dos helênicos.
Quanto à esperança, a partir dos ensinamentos contidos no Novo Testamento, cumpre-nos asseverar, com propriedade: aquela, sim, sempre existiu, existirá e jamais morrerá, nem que seja a última.

24 de outubro de 2010


         “Andar com fé eu vou, que a fé não costuma faiá...” Certamente, muitos leitores sabem que este verso pertence a uma das mais belas canções da música popular brasileira – Andar com fé, do compositor e cantor Gilberto Gil. E o poeta, que a concebeu, literalmente não falhou, ao afirmar, de forma categórica, que andar e falhar caminham de mãos dadas com a fé. Não basta, portanto, ter somente fé. A posse da fé tem sentido se andarmos com ela; e, ao caminharmos com fé, descobrimos que ela é infalível! O poeta sintetizou a verdade, a experiência e a natureza da fé em um verso singular!
         Vãs seriam todas as tentativas se algum mortal se dispusesse a criar um conceito para fé; ou não haveria linhas suficientes para abarcar o universo que compreende tudo aquilo que é crível, e que, desse modo, existe por causa da fé. A fé, assim, é a força motriz para que a vida daqueles que acreditam em algo ou em alguém tenha sentido pleno, e que, como diz o verso da canção, não costuma falhar. Ratificando bem: não costuma falhar; e se falha, a culpa é exclusivamente nossa, é claro!
         Pense bem na palavra fé: um vocábulo monossílabo, oxítono, e que cabe no bolso de qualquer pessoa! Tão sintético, mas que concentra um vigor capaz de engolir universos inteiros! Aparentemente pequeno e imperceptível, mas imensurável em sua essência abstrata, e responsável por todas as conquistas na vida daqueles que aspiram à vitória como condição fundamental para serem pessoas que buscam incansavelmente a felicidade, que exercem a prática do amor ao próximo, e, sobretudo, carregam dentro dos corações o último dos grandes sentimentos: a esperança.
        Ora, se, por um lado, a fé surge como luminar minúsculo, mas que possui uma energia exuberante e inesgotável, por outro lado, a fé emerge diante de nossa visão, muitas vezes limitada, como se fosse uma verdadeira locomotiva, cujos vagões representam toda a cadeia de valores e princípios que dela emanam. Limitada, sim, porque nós a limitamos com a nossa incredulidade, que a torna menor do que um grão de mostarda. Logo, a fé é mais do que energia, dinâmica, força etc. Embora pareça estar no mundo das abstrações, a fé está, implacavelmente, no mundo das formas palpáveis e concretas; nas atitudes dos homens e nas mulheres de boa vontade; na transformação dos impossíveis em possíveis absolutos, que nos surpreendem ao longo de nossa trajetória como seres humanos.
         Se a fé não tem nada a ver com a visão ocular, mas, sim, com a percepção extra-sensorial, a sensibilidade dá o tom do fenômeno daquela em nossas vidas; e, no desaguar de nossos sentimentos mais nobres, a fé é esta matriz que promove, consolida e multiplica as ações, que humanizam o mundo e tornam os valores mais justos e igualitário entre aqueles que, desafortunadamente, são excluídos do bem - estar, em todos os níveis.
       A fé não deve remover montanhas! Não! A fé deve remover os corações dos homens para que o amor floresça e seja a chave de acesso para a transformação de vidas em mundo que almeja justiça. A fé não deve ser invisível! Não! A fé deve ser o elemento mais visível, mais cristalino, dentre todas as coisas que existem no mundo para que um ser humano, ao contemplá-la, possa descobrir, por esta via, o real valor da confiança – pilar de sustentação para todas as relações que se pautam no respeito mútuo, na amizade fraterna e na verdadeira comunhão, que, por sua vez, deve ser traduzida por atitudes que elevem o Homem no campo dos valores espirituais, de forma incondicional.
         A fé não vem do alto. Não! A fé, assim como a sabedoria, foi criada antes de o mundo ser formado pelo Criador. Logo, a sua existência precede a de todos os seres viventes, criaturas e filhos de Deus que habitam este planeta. Ela não está em lugar algum; cada ser humano nasce com ela! Sim! A fé é uma semente que já está cultivada em nossos corações. Devemos tão somente regá-las para que ela cresça, se desenvolva e se transforme em árvore frondosa. Essa é a obrigação de cada um de nós; esse é o dever de casa que todos devemos fazer, todos os dias, até o dia em que cessar a nossa caminhada por essa vereda sinuosa chamada Vida.
          A fé produz coragem, e a coragem destrói os medos que sempre nos rondam como fantasmas quase invencíveis. Armados para a batalha e fortalecidos pela fé, podemos, então, andar; andar de cabeça erguida, acreditando no amanhã cada vez mais promissor. Assim, a fé jamais falhará, pois somos nós as verdadeiras sentinelas dessa força que é capaz de mover céus e mares; de tocar o coração de Deus; e de operar milagres.
          Lancemos  o  nosso  olhar  sobre  as  escrituras  sagradas  e  reflitamos.  Eis  o que diz o apóstolo Paulo em uma de suas cartas: “Porque andamos por fé e não por vista” (2 Coríntios 5 : 7). Bom seria, então, se todos nós fôssemos cegos; mas, ainda assim, Deus, em sua misericórdia infinita, nos concedeu um par de olhos para que, em não buscando a fé, que está dentro de cada um de nós, pudéssemos ter a chance de aprender a se apossar de algo que é inerente aos filhos de Deus, e que de nós jamais será roubada ou aniquilada! Andemos com fé, prossigamos com fé, pois “ela” jamais falhará; quer dizer, o poeta brincou com as palavras e o sujeito da ação – na verdade, a fé não costuma falhar, mas somos nós quem falhamos! Andemos com fé para que não falhemos...
                                        
                                João Carlos de Souza Ribeiro
                                     Pós Doutor em Poética