Conheçamos e prossigamos em conhecer ao Senhor; a sua saída, com a alva, é certa;
e Ele nós virá como a chuva, como a chuva serôdia que rega a terra.
Oséias 6 : 3

24 de outubro de 2010


         “Andar com fé eu vou, que a fé não costuma faiá...” Certamente, muitos leitores sabem que este verso pertence a uma das mais belas canções da música popular brasileira – Andar com fé, do compositor e cantor Gilberto Gil. E o poeta, que a concebeu, literalmente não falhou, ao afirmar, de forma categórica, que andar e falhar caminham de mãos dadas com a fé. Não basta, portanto, ter somente fé. A posse da fé tem sentido se andarmos com ela; e, ao caminharmos com fé, descobrimos que ela é infalível! O poeta sintetizou a verdade, a experiência e a natureza da fé em um verso singular!
         Vãs seriam todas as tentativas se algum mortal se dispusesse a criar um conceito para fé; ou não haveria linhas suficientes para abarcar o universo que compreende tudo aquilo que é crível, e que, desse modo, existe por causa da fé. A fé, assim, é a força motriz para que a vida daqueles que acreditam em algo ou em alguém tenha sentido pleno, e que, como diz o verso da canção, não costuma falhar. Ratificando bem: não costuma falhar; e se falha, a culpa é exclusivamente nossa, é claro!
         Pense bem na palavra fé: um vocábulo monossílabo, oxítono, e que cabe no bolso de qualquer pessoa! Tão sintético, mas que concentra um vigor capaz de engolir universos inteiros! Aparentemente pequeno e imperceptível, mas imensurável em sua essência abstrata, e responsável por todas as conquistas na vida daqueles que aspiram à vitória como condição fundamental para serem pessoas que buscam incansavelmente a felicidade, que exercem a prática do amor ao próximo, e, sobretudo, carregam dentro dos corações o último dos grandes sentimentos: a esperança.
        Ora, se, por um lado, a fé surge como luminar minúsculo, mas que possui uma energia exuberante e inesgotável, por outro lado, a fé emerge diante de nossa visão, muitas vezes limitada, como se fosse uma verdadeira locomotiva, cujos vagões representam toda a cadeia de valores e princípios que dela emanam. Limitada, sim, porque nós a limitamos com a nossa incredulidade, que a torna menor do que um grão de mostarda. Logo, a fé é mais do que energia, dinâmica, força etc. Embora pareça estar no mundo das abstrações, a fé está, implacavelmente, no mundo das formas palpáveis e concretas; nas atitudes dos homens e nas mulheres de boa vontade; na transformação dos impossíveis em possíveis absolutos, que nos surpreendem ao longo de nossa trajetória como seres humanos.
         Se a fé não tem nada a ver com a visão ocular, mas, sim, com a percepção extra-sensorial, a sensibilidade dá o tom do fenômeno daquela em nossas vidas; e, no desaguar de nossos sentimentos mais nobres, a fé é esta matriz que promove, consolida e multiplica as ações, que humanizam o mundo e tornam os valores mais justos e igualitário entre aqueles que, desafortunadamente, são excluídos do bem - estar, em todos os níveis.
       A fé não deve remover montanhas! Não! A fé deve remover os corações dos homens para que o amor floresça e seja a chave de acesso para a transformação de vidas em mundo que almeja justiça. A fé não deve ser invisível! Não! A fé deve ser o elemento mais visível, mais cristalino, dentre todas as coisas que existem no mundo para que um ser humano, ao contemplá-la, possa descobrir, por esta via, o real valor da confiança – pilar de sustentação para todas as relações que se pautam no respeito mútuo, na amizade fraterna e na verdadeira comunhão, que, por sua vez, deve ser traduzida por atitudes que elevem o Homem no campo dos valores espirituais, de forma incondicional.
         A fé não vem do alto. Não! A fé, assim como a sabedoria, foi criada antes de o mundo ser formado pelo Criador. Logo, a sua existência precede a de todos os seres viventes, criaturas e filhos de Deus que habitam este planeta. Ela não está em lugar algum; cada ser humano nasce com ela! Sim! A fé é uma semente que já está cultivada em nossos corações. Devemos tão somente regá-las para que ela cresça, se desenvolva e se transforme em árvore frondosa. Essa é a obrigação de cada um de nós; esse é o dever de casa que todos devemos fazer, todos os dias, até o dia em que cessar a nossa caminhada por essa vereda sinuosa chamada Vida.
          A fé produz coragem, e a coragem destrói os medos que sempre nos rondam como fantasmas quase invencíveis. Armados para a batalha e fortalecidos pela fé, podemos, então, andar; andar de cabeça erguida, acreditando no amanhã cada vez mais promissor. Assim, a fé jamais falhará, pois somos nós as verdadeiras sentinelas dessa força que é capaz de mover céus e mares; de tocar o coração de Deus; e de operar milagres.
          Lancemos  o  nosso  olhar  sobre  as  escrituras  sagradas  e  reflitamos.  Eis  o que diz o apóstolo Paulo em uma de suas cartas: “Porque andamos por fé e não por vista” (2 Coríntios 5 : 7). Bom seria, então, se todos nós fôssemos cegos; mas, ainda assim, Deus, em sua misericórdia infinita, nos concedeu um par de olhos para que, em não buscando a fé, que está dentro de cada um de nós, pudéssemos ter a chance de aprender a se apossar de algo que é inerente aos filhos de Deus, e que de nós jamais será roubada ou aniquilada! Andemos com fé, prossigamos com fé, pois “ela” jamais falhará; quer dizer, o poeta brincou com as palavras e o sujeito da ação – na verdade, a fé não costuma falhar, mas somos nós quem falhamos! Andemos com fé para que não falhemos...
                                        
                                João Carlos de Souza Ribeiro
                                     Pós Doutor em Poética